sábado, 26 de fevereiro de 2022

1978 - ANO SEIS

 

1ª JORNADA MÁGICA DE LAMEGO

Por iniciativa do PROF. CHASTEN e com a colaboração do CIF e da MAGIARTE, o mês de Abril registou este evento, no qual participei como actuante a solo e integrado no grupo SKORPIUS. Foi uma excelente jornada de convívio, cumprindo o objectivo de levar as mais diversificadas actuações de ilusionismo a um palco no interior do país. A presença da MAGIARTE (com o Prof. Armindo de Matos) neste evento, depois de já ter marcado presença no Festival da Figueira do ano anterior, fazia augurar o retomar da sua actividade comercial em pleno. Tal, só viria a acontecer, mais tarde, pela mão de TONY KLAUF.

Durante o ano continuei a adquirir alguns livros que pudessem contribuir para ampliar a minha formação mágica. Por motivos diferentes dois deles merecem destaque: "Colombini's Cups and Balls" (de Lewis Ganson) e "Esto Es Magia" (de Alfonso Moliné). O primeiro foi a base de trabalho para uma rotina de covilhetes que me acompanhou durante muitos anos e o segundo "chegou com anos de atraso", pois era o livro que gostaria de ter tido quando me comecei a interessar por ilusionismo. Em termos bibliográficos também é oportuno registar a publicação do primeiro fascículo do "Dicionário do Ilusionismo em Portugal" da autoria de Camacho Barriga "JÓNIO".

O S.M.O. 

As iniciais S.M.O. servem para indicar Serviço Militar Obrigatório, que foi o meu destino a partir de meados deste ano. Calhou-me, em sorte, a ida para a Marinha com a consequente prestação de serviço em Lisboa. Como iria passar dois anos em Lisboa, pensei em poder rentabilizá-los de alguma maneira, até porque, nos primeiros tempos, o ordenado da tropa era parco e precisaria de algum reforço. Houve colegas que solicitaram autorização para dar aulas e tal foi-lhes permitido. 

Dado que, na altura, havia várias boites em Lisboa que contratavam mágicos e outras atracções, programando shows semelhantes aos dos casinos, decidi solicitar autorização para realizar espectáculos profissionais como mágico. Infelizmente, nessa altura, ainda havia muitos preconceitos relativamente à nossa Arte. Por isso a resposta obtida foi negativa, escudada numa justificação que, ainda hoje, recordo tintim por tintim: "A prática do ilusionismo não era atinente da valorização profissional de um oficial da Reserva Naval." 

Confesso que, ao receber tal despacho, consultei um dicionário para ter a certeza do significado de atinente...

A CONVENÇÃO API 78

Entre 10 e 12 de Novembro, realizou-se mais uma Convenção da Associação Portuguesa de Ilusionismo, a qual me proporcionou a possibilidade de assistir a duas conferências magistrais: as de ASCANIO e SLYDINI. 

As memórias das diversas conferências do mestre ASCANIO a que assisti, ao longo dos anos, misturam-se de forma a deixarem uma impressão global da sua grande mestria com cartas, em que cada movimento era pensado e estudado ao pormenor e plenamente justificado por toda a teoria por si explanada. Apercebi-me, por vezes, que as suas longas e pormenorizadas explicações cansavam os presentes no público que eram menos ligados à Cartomagia. Mas, para aqueles que o eram, não havia qualquer cansaço desse tipo (ou de outro) e as conferências poderiam demorar o dobro do tempo, que haveria sempre ensinamentos a colher.

Aqui pode ter-se uma ideia da magia com cartas de ASCANIO.

As memórias da conferência de SLYDINI (e das suas actuações) estão totalmente localizadas neste momento, por ter sido a única oportunidade que tive de o ver ao vivo. Tendo andado a ler e a praticar os lappings aprendidos no livro "The Magic of Slydini" que adquirira dois anos antes na FISM, foi um verdadeiro regalo poder ver o mestre a executá-los de uma forma tão perfeita! Ainda hoje guardo "religiosamente" dois pequenos tesouros que adquiri na sua conferência: os alfinetes dourados e os lenços brancos. É, portanto, fácil de adivinhar que os seus truques "The Mystery of the Gold Pins" e "The knotted silks" viriam a fazer parte do meu repertório de close-up.

Aqui pode ser vista uma actuação de SLYDINI, precisamente a executar a referida rotina de lenços.

NOTAS DE RODAPÉ

Nota de sinal + : A conferência e a actuação de ASCANIO.
Nota de sinal + : A conferencia e a actuação de Slydini.
Nota de sinal - : A prática do ilusionismo não ser atinente da valorização profissional de um oficial da Reserva Naval.

P.S.: Ao escrever este post lembrei-me de completar o anterior com uma breve história. Por isso editei o conteúdo do post "1977 - ANO CINCO (Parte 2)", acrescentando tal história.

domingo, 20 de fevereiro de 2022

1977 - ANO CINCO (Parte 2)


FESTIVAL DA FIGUEIRA, ESCORIAL E CONVENÇÃO API

Entre 9 e 12 de Junho decorreu mais um Festival Mágico da Figueira, no qual estive presente, apenas como espectador. Recordo as  excelentes  conferências de ALDO COLOMBINI (ainda usando o nome FABIAN), RODEN e CAMPS. Foi nesta última que tomei contacto, pela primeira vez, com uma rotina de "Peixe cortado e recomposto", que iria servir de base de trabalho para construir aquela que é a minha rotina. Um dos complementos culturais desta edição do Festival Mágico da Figueira foi uma exposição de 42 quadros de um artista local (Zé Carlos), glosando 42 truques, mais ou menos icónicos, que são apresentados pelos ilusionistas. 

O grande açambarcador de prémios do Festival foi JOFERK, que, entre outros mais, obteve quatro primeiros prémios (Magia Geral, Magia Cómica, Micromagia e Grandes Ilusões), mostrando, uma vez mais, que era um artista eclético. Também é de referir JODIVIL & MARGOT que obtiveram o Grande Prémio do Festival. Durante este recebemos a notícia da morte de Eduardo Relvas "SAVLER", que era referido, carinhosamente, dentro da comunidade mágica portuguesa, como "Pai Relvas".

Eu, tendo passado o Festival num dolce far niente, voltaria, dias mais tarde, à Figueira da Foz, para trabalhar, cumprindo um contrato com o Casino da Figueira. Para tal tive que fazer "alguma ginástica" relativamente às aulas em que deveria estar presente. Como a última noite de trabalho foi num domingo e, na manhã de segunda feira eu tinha uma aula importante às 10h30 projectei o meu regresso para bem cedinho nesse dia. Faltaria conscientemente às aulas das 8h30 e 9h30, mas estaria presente nessa "aula imprescindível" das 10h30. Assim quando, por volta das 2h00 da madrugada subi para o quarto no hotel onde estava hospedado (Albergaria Nicola, mesmo em frente ao Casino), pedi para ser despertado às 6h30. Portanto quando acordei e vi as horas, soltei uma imprecação de raiva contra o recepcionista pois já passava das 10h00. Nada havia a fazer. Já só poderia assistir às aulas da tarde. Claro que, ao fazer o check-out, fiz o reparo relativamente ao facto de não ter sido despertado na hora prevista. E fui surpreendido com a resposta do recepcionista. Tinha-me telefonado às 6h30, eu atendera e agradecera o aviso. Por isso até estranhara eu não tivesse descido após meia hora, mas pensou que, provavelmente, o pedido de despertar era fruto da necessidade de tomar alguma medicação à hora marcada. Não tive dúvidas que a resposta fora sincera, mas eu não me lembrava de ter atendido o telefone. Faltei à "aula imprescindível" mas aprendi uma lição. A partir desse dia sempre que, estando hospedado num hotel, tive necessidade de ser despertado a horas muito matutinas, optei por afastar o telefone para bem longe da cama, para me obrigar a sair do leito quanto tivesse necessidade de o atender.

Entre 28 e 30 de Outubro participei nas Jornadas Mágicas do Escorial. Fi-lo na companhia de JOFERK, MAURY e IVO (Fred Alan). Este encontro mágico tem uma componente muito pessoal do respectivo organizador (JUAN TAMARIZ) que, na época, juntamente com ASCANIO, era o "motor" da Escuela Magica de Madrid. Foram dias intensos essencialmente preenchidos por Cartomagia. Para descontrair tivemos a visitas dos amigos NICHOLS & HONEY, aproveitando para conviver durante um almoço num restaurante das redondezas.

Ainda hoje recordo a maestria que GABRIEL MORENO e LUÍS GARCIA demonstraram ao abordar o tema Second Deal. Pareciam extra-terrestres... Para além dos apontamentos fornecidos relativamente a cada um dos temas tratados, foi neste evento que adquiri o primeiro volume de LA MAGIA DE ASCANIO ("edición canutillo" da Escuela Magica de Madrid), que tanto me ajudou a começar a entender os conceitos teóricos do mestre ASCANIO.

O ano de 1977 proporcionou-me, ainda, a participação em mais um evento mágico: a Convenção API que decorreu nos dias 26 e 27 de Novembro. Entre as três conferências do evento ficou-me na memória a de CAMILO VASQUEZ, o Campeão Mundial FISM 1973 de Micromagia e, também ele, um elemento destacado da Escuela Magica de Madrid. Dado o facto de já ter terminado o curso, mas ainda não ter emprego, aproveitei esta convenção para "ganhar uns cobres", tendo a minha primeira experiência como Magic Dealer. Para tal fabriquei  o material para três truques que criara a partir de outros já existentes. Eis a reprodução dos envelopes de dois deles.


NOTAS DE RODAPÉ

Nota de sinal + : O projecto SKORPIUS
Nota de sinal + : A presença nas Jornadas Mágicas do Escorial.
Nota de sinal - : O falecimento do "Pai Relvas".

POST SCRIPTUM

Em 11 de Março de 2023 descobri, nos Arquivos da RTP, a gravação de um programa com uma reportagem circunstanciada sobre a Convenção API acima referida. Tal programa está referido neste post.

sábado, 19 de fevereiro de 2022

1977 - ANO CINCO (Parte 1)

 

OS MÁGICOS

Este foi o nome do espectáculo público integrado nas comemorações de S. João Bosco levado a cabo pelo CIF no dia 14 de Fevereiro no Teatro Sá da Bandeira. Foi uma iniciativa louvável da Secção de Ilusionismo do Clube Fenianos Portuenses que pretendeu, com ela, aproximar a Magia dum público mais abrangente daquele que frequentava, por norma, os espectáculos realizados na sede do clube. A crítica publicada em 16 de Fevereiro, no jornal "O Comércio do Porto" foi a que, seguidamente, reproduzo.

Fruto da dinâmica de trabalho que, nessa época, existia no CIF foram criados dois grupos de mágicos para apresentar rotinas de Grandes Ilusões. Juntamente com o UL-DE-KAR formei o grupo SKORPIUS (ao qual também se associou para colaborar o OLIMACK) e preparamos um efeito (A  Decapitação) baseado num dos quadros do espectáculo de JOHN CALVERT em que ambos tínhamos trabalhado. O funcionamento mecânico da ilusão era substancialmente diferente e suficientemente seguro para o OLIMACK arriscar a própria cabeça nele. Ao contrário da apresentação de CALVERT, que era cómico-burlesca, a nossa encenação era "pesada" e o público tinha direito a ver sangue jorrar durante o corte da cabeça (Nota: não só ver como também sentir alguns salpicos, como viria a acontecer num espectáculo posterior em que as dimensões do palco obrigaram a uma menor distância relativamente à primeira fila da plateia).

Portanto nesse espectáculo, além de apresentar a minha premiada rotina de manipulação, apresentei (em parceria com UL-DE-KAR), pela primeira vez, um número de Grandes Ilusões. A estreia dessa rotina correu muitíssimo bem e fomos, inclusivamente, elogiados pelo categorizado Roberto (da dupla NICHOLS & HONEY). O que também relembro desse espectáculo foi a ovação espontânea com que fui interrompido quando, durante a rotina de manipulação, realizava o meu  último efeito mágico : o bastão dançarino. Por isso, nessa noite, a rotina ficou um pouco mais curta. Dado o êxito do programa, a empresa do Teatro Sá da Bandeira contratou-nos para realizar uma mini-série de 3 espectáculos num dos fins de semana seguintes.

As comemorações de S. João Bosco não se limitaram a este espectáculo público e tiveram outras actividades realizadas apenas entre os ilusionistas. Uma dessas actividades foi inovadora no ambiente mágico. Tratou-se de um "Rali Paper" realizado nas ruas da cidade do Porto, o qual, além de permitir um salutar convívio entre os participantes também ajudou a divulgar o espectáculo já referido.

Uma das outras actividades integradas nas comemorações de S. João Bosco, foi o almoço convívio realizado num conceituado restaurante situado nos arredores do Porto. No final do repasto houve os tradicionais discursos. Delas, recordo com carinho a intervenção do saudoso LE-A-FAR, pois incluiu uma situação que ficou bem gravada na minha memória. Ao finalizar a sua intervenção, LE-A-FAR informou que, pouco tempo antes, tinha estado no Brasil e era portador de diplomas "Magirama" que lhe tinham sido entregues pelo CONDE RAMSÉS para homenagear alguns mágicos portugueses que se haviam distinguido em escritos sobre Ilusionismo. Mas quando entregou, a um dos homenageados, um diploma sem nome, logo se percebeu que os diplomas tinham vindo do Brasil apenas com a assinatura de CONDE RAMSÉS e fora a escolha de LE-A-FAR que determinara a "lista de homenageados". Isto permitiu-me aferir a dimensão correcta de certas distinções atribuídas no país irmão que, nas minhas leituras, tinha visto referenciadas.


O MEU PRIMEIRO "HECKLER"

1977 foi também o ano em que terminei o meu curso de Engenharia de Telecomunicações. Por isso, em data que não consigo precisar, realizou-se o habitual "Jantar de Fim de Curso". Se a data não relembro, o local ainda está bem presente na minha memória: a "Farmácia Campos" em Matosinhos! E já agora convém referir que o restaurante tinha, na altura, um nome pelo qual toda a gente o conhecia: "O Farta Brutos".

Embora eu não andasse pelos cantos da Faculdade com um baralho na mão a "impingir truques" aos colegas, todos eles conheciam a minha ligação ao Ilusionismo. Por isso era inevitável que, no final do repasto, me iriam solicitar uma actuação improvisada... para a qual eu ia, obviamente, preparado.

Nessa noite, um dos efeitos que decidi apresentar foi uma rotina "Fora Deste Mundo". E foi aqui que tive o azar de fazer uma má escolha do espectador que iria separar as cartas entre pretas e vermelhas pois escolhi um "brincalhão" (Nota: creio que esse "brincalhão" foi o Pedro Sampaio). E o que fez ele? Escolher sempre a mesma cor!... Claro que a rotina terminou (e bem!) quando atingi metade do baralho, mas, os mágicos percebem que teria sido muito mais impactante se usasse todo o baralho.

Naturalmente que são experiências deste tipo que nos fazem crescer. Por isso, na época, deixei de apresentar essa rotina até encontrar uma solução que fosse "à prova de brincalhão". Encontraria tal solução alguns meses depois e pude voltar a apresentar, com confiança, tal rotina. A solução que encontrei faz parte integrante do efeito "Out of this water" descrito pelo meu filho (HELDER GUIMARÃES) na sua colaboração para o livro "BEST OF ALL WORLDS".

Amanhã haverá novo post referente a 1977.

sábado, 12 de fevereiro de 2022

1976 - ANO QUATRO


A FISM NA CIDADE DE JOHANN STRAUSS 

Para mim este ano iniciou-se com o meu primeiro contrato com o "Monumental Casino" da Póvoa do Varzim, mas o facto mais relevante do ano foi o 13º CONGRESSO FISM, realizado em Viena (Áustria) entre 7 e 11 de Julho. 

Não tendo, obviamente, o mesmo impacto que, três anos antes, tivera em mim a FISM de Paris (relembro que, nessa altura, era "virgem" em relação a congressos e festivais de magia), foi um congresso que me proporcionou assistir a inúmeras actuações de elevada qualidade. E a primeira que me vem à ideia é a soberba actuação de BORRA, um artista de pickpocket, mas, no fundo, um verdadeiro showman, com uma capacidade de lidar e interagir com a presença de espectadores em palco como, até então, nunca tinha observado.

Também foi a primeira vez que assisti a uma actuação da dupla THE MORETTIS, que tanto furor viriam a fazer, nos anos subsequentes, em festivais e congressos de Magia com a sua inigualável "Caixa das Espadas em Cartão". Igualmente, a participação da dupla espanhola NICHOLS & HONEY (com os quais viría a fazer amizade) no espectáculo de gala que decorreu no "Theater an der Wien" foi objecto de muitos elogios. A sua "Cesta Hindu" permanece como sendo a melhor que vi até hoje. O DUO ABSOLON teve uma actuação soberba com a impecável manipulação de chaves e correntes, devidamente enquadradas num pequena "peça teatral" em que personificavam carcereiro e prisioneira. No mesmo espectáculo foi, igualmente, fantástico rever as fabulosas rotinas de ALI BONGO e SHIMADA.

Numa outra gala foi muito bom poder assistir à actuação de duas verdadeiras lendas vivas: PROF. SITTA (uma actuação sua pode ser vista aqui) e KUDA BUX (uma actuação sua pode ser vista aqui). A rotina apresentada por este último ainda hoje tem, para mim, alguns contornos de verdadeiro mistério.

Os concursos também proporcionaram muitos momentos de elevada qualidade. Em Micromagia a actuação que ainda recordo é a de ALDO COLOMBINI (que, na época, usava o nome artístico "MR. FABIAN") e os seus covilhetes "voadores". Notar que obteve o segundo lugar na competição, mas, na óptica de muitos, merecia o primeiro. Anos mais tarde, essa rotina seria publicada num livrinho editado por Supreme Magic e eu iria usá-la como base de uma rotina mágica que apresentei em diversos espectáculos. Em Cartomagia recordo a excelente rotina do espanhol TONY CACHADIÑA.

Nos concurso de palco recordo, naturalmente, PIERRE BRAHMA, que foi galardoado com o Grande Prémio com a sua rotina de jóias e moedas. É fantástico admirar um artista que ultrapassa um forte handicap (falta de audição) e consegue uma actuação perfeita ao ritmo da música. As actuações de JAN TORELL (2º lugar em Magia Geral), PETRICK & MIA (não obteve prémio), e ROY GARDNER & ASSISTANT (1º lugar em Magia Cómica) foram prestações que, igualmente, permanecem na minha memória.

No que se refere à componente social o programa estabelecia uma ceia num "Heuriger" (uma típica taberna vienense). A comitiva portuense (alguns dos quais tinham experienciado a recepção na Orangerie do Palácio de Versalhes na FISM 1973) abordou o cumprimento deste ponto do programa na expectativa de um opíparo jantar. Por isso o copo de vinho que foi servido acompanhado de algo para "picar" soube a muito pouco. Valeu o descontraído ambiente de convívio em que grupos de diversas nacionalidades cantaram espontaneamente canções típicas dos respectivos países. E o vinho fazia um belo efeito... Terá sido essa a razão pela qual, à saída, um dos congressistas queria levar, como "recuerdo", a cadeira em que estivera sentado?

Na comitiva portuense, a visita ao "Heuriger" teve uma consequência que poderemos classificar de... "humorística". Passados dois dias estava programada uma recepção na Câmara Municipal de Viena seguida de baile. O vestuário recomendado era, naturalmente, formal, mas nada era especificado quando a "comes e bebes". Por isso, no trajecto para o Wiener Rathaus, paramos numa roulotte de comida rápida e, ali mesmo, em pé e trajando os nossos melhores fatos de gala, tratámos de aconchegar o estômago para o caso de se repetir a situação vivenciada no "Heuriger". Esse "aperitivo" ingerido por precaução não nos impediu de apreciar o excelente jantar de gala que nos foi proporcionado no palácio.

Na Feira Mágica do Congresso tive que ser bastante selectivo quanto a compras, pois ainda era estudante e a mesada não era elástica. Mas adquiri dois livros fundamentais para a boa formação de qualquer mágico: "The Dai Vernon Book of Magic" e "The Magic of Slydini", ambos da autoria de Lewis Ganson.

No pouco tempo que o Congresso me deixou livre, pude passear por Viena e sentir a cultura ser emanada em parques e jardins. Lembro-me, durante anos, de pensar que, se algum dia tivesse que escolher uma cidade estrangeira para viver, essa cidade seria, indubitavelmente, Viena.

Mais alguns factos marcaram o panorama mágico português no ano de 1976, os quais, seguidamente se registam de forma breve. Em 9 de Julho faleceu D. AGUINALDO. Aqui registo que recebi dele importantes ensinamentos quando estava a preparar a minha rotina de manipulação de cigarros acesos. Um desses ensinamentos foi perpetuado no artigo "LEMBRANDO D. AGUINALDO" que escrevi e foi publicado em "A Folha Mágica" (CIF) de Abril de 1995. Seguidamente apresento dois curiosos  panfletos publicitários de D. AGUINALDO, datados de 1951 e 1965.

Em 20 de Agosto foi efectuada a escritura relativa à criação da Associação Portuguesa de Ilusionismo. Por coincidência, nesse mesmo dia estreou em Lisboa o espectáculo "O Mundo Fantástico da Magia" encabeçado por RICHIARDI Jr.. Foi uma tentativa de reeditar o êxito que, em 1972, tivera o "1º Festival Internacional de Magia", mas a época do ano (Verão) não foi propícia, tal como não tinha sido, no ano anterior, para o espectáculo de JOHN CALVERT, no Porto. Como o espectáculo não veio à cidade invicta, desloquei-me a Lisboa para, a ele, poder assistir. No respectivo elenco destaco, além de RICHIARDI Jr., as presenças de RICHARD ROSS (que, em 1973, na FISM Paris conquistara pela segunda vez o Grande Prémio) e OTTO WESSELY.

NOTAS DE RODAPÉ

Nota de sinal + : A FISM de Viena.
Nota de sinal + : A criação da Associação Portuguesa de Ilusionismo.
Nota de sinal - : O falecimento de D. AGUINALDO.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

1975 - ANO TRÊS (Parte 3)

 

A REVISTA "QUATRO ASES"

O mês de Novembro de 1975 proporcionou à comunidade mágica portuguesa dois factos relevantes que merecem o destaque neste post.

Um deles foi o retomar da publicação da revista QUATRO ASES, após nove anos de interregno. Lembro que a publicação de QUATRO ASES se iniciara em 1958 sob a "batuta" de Dr. António de Meneses e tendo como redactores principais OSODRAC e HERBERT. Essa "primeira vida" de QUATRO ASES duraria até 1966.

Portanto, após nove anos de "hibernação", reapareceu uma revista que havia sido muito elogiada na época, tendo, inclusivamente, sido distinguida, em 1959, com um prémio no Congresso Espanhol de Sevilha. Agora já sem a presença do Dr. António de Meneses (entretanto falecido em Outubro de 1968), mas com a equipa de redactores responsáveis reforçada com JÓNIO e SAIUR, que, seguramente, eram, nessa época, dois dos elementos da comunidade mágica portuguesa mais conhecidos e conhecedores. Esta "segunda vida" de QUATRO ASES viria a terminar no final de 1979, tendo mantido um elevado padrão de qualidade e sendo, ainda hoje um bom repositório de ensinamentos em língua portuguesa para os novos mágicos.


A 1ª CONVENÇÃO PORTUGUESA DE MAGIA

Em 1 e 2 de Novembro realizou-se, em Lisboa um encontro de mágicos portugueses que se designou "1ª Convenção Portuguesa de Magia". Tal encontro incluiu o espectáculo público ISTO É MAGIA, que se realizou no Teatro S. Luiz e de cujo programa se reproduz a capa e a primeira página. Em termos mágicos esta convenção permitiu-me tomar contacto com a criatividade de ALI BONGO, cuja "loucura" eu já conhecia das suas actuações em palco.

A Convenção incluiu uma reunião para discutir os moldes da criação de uma futura associação que englobasse os mágicos portugueses. Da reunião saiu uma comissão constituída por JODIVIL, JÓNIO, Dr. Jorge Teixeira, JOMAGUY e Marques Pinto. Eu e o Sr. Marques Pinto viríamos a abandonar tal comissão na sequência de uma reunião do CIF, que se realizou em 17 de Dezembro. 

Nessa reunião, considerando que os ilusionistas do Porto e concelhos circunvizinhos já se encontravam agrupados no Clube Ilusionista Fenianos (Secção do Clube Fenianos Portuenses), resolveu-se apontar numa direcção diferente da prevista formação de uma associação nacional de ilusionistas. Seria a formação de clubes idênticos ao CIF em diferentes zonas do país, nomeadamente, Lisboa, para depois se pensar na criação de um organismo de cúpula que coordenasse a defessa dos interesses da classe a nível nacional. Tal ideia era muito semelhante à perfilhada por José Luís Machado "ZYTTO", a qual foi exposta na "Carta Aberta..." publicada na revista QUATRO ASES de Janeiro de 1976. De certa maneira o CIF tentou proteger-se de um provável esvaziamento de sócios a que a formação de um clube nacional poderia conduzir.

NOTAS DE RODAPÉ

Nota de sinal + : O 1º prémio de Manipulação no Festival da Figueira.
Nota de sinal + : A participação no espectáculo de JOHN CALVERT.
Nota de sinal + : O reatar da publicação de QUATRO ASES.

domingo, 6 de fevereiro de 2022

1975 - ANO TRÊS (Parte 2)

 


JOHN CALVERT E O ESPECTÁCULO MAGICARAMA

Em meados deste ano atracou no Porto o iate MAGIC CASTLE, propriedade do ilusionista JOHN CALVERT, que nele se fazia transportar juntamente com a sua esposa (e partenaire) TAMMY e o seu empregado Henry.  A bordo também vinha todo o equipamento do seu grande espectáculo MAGICARAMA, o qual podia ser apresentado em qualquer cidade costeira em que decidisse parar durante as suas viagens marítimas, bastando, para tal, contratar alguns ajudantes locais.

Foi precisamente isso que aconteceu no Porto. O seu primeiro contacto foi com o JOFERK, o qual o apresentou aos mágicos do CIF. Desde logo ele manifestou a vontade de apresentar o seu espectáculo na nossa cidade, pelo que foi encaminhado para a sala de espectáculos que seria adequada para o efeito e que já tinha alguma tradição de receber espectáculos de ilusionismo (o último havia sido em 1972, com RICHIARDI Jr. como cabeça de cartaz): o Teatro Sá da Bandeira.

Dado que eu tinha um certo à-vontade na língua inglesa disponibilizei-me para ser o seu tradutor na abordagem à gerência do Teatro Sá da Bandeira. Depois do "negócio" ter sido fechado, CALVERT tinha que completar o elenco com "mão-de-obra" local. Ele tentou contratar os quatro assistentes masculinos de que necessitava no âmbito dos ilusionistas jovens do CIF, tendo conseguido apenas três: eu próprio, Raul de Carvalho "UL-DE-KAR" e José Ribeiro "JOY". Nove das dez assistentes femininas que necessitava foram contratadas num casting realizado na sequência de um anúncio publicado na imprensa. Observar tal casting e perceber as razões de CALVERT para optar por uma assistente em detrimento de outra foi uma das muitas lições que a minha temporada junto do grande ilusionista americano me proporcionou. Perceber como se monta um grande espectáculo teatral de duas horas foi outra.

O espectáculo não foi um estrondoso êxito e o facto de ter decorrido em pleno verão também não o favoreceu, mas direi que a grande maioria dos espectadores que a ele assistiram saíram da sala satisfeitos e com a noção de terem passado duas horas de bom entretenimento. Claro que não se pode agradar a toda a gente... Por isso a crítica escrita por CARDINAL na sua colaboração semanal nas páginas do JN, não foi a melhor. E, nessa crítica, a minha colaboração também foi questionada.

Mesmo antes de ler o texto de CARDINAL, já tinha percebido que fazia alguma confusão a certas mentalidades do nosso meio mágico que eu, tendo obtido poucos meses antes o 1º Prémio de Manipulação no Festival Mágico da Figueira da Foz, aceitasse uma simples posição de ajudante num espectáculo de Ilusionismo. No entanto, não me "caíram os parentes na lama" por fazê-lo e proporcionei a mim mesmo, numa fase inicial da minha carreira, a possibilidade de obter um conjunto de valiosos ensinamentos que, de outra maneira, demoraria vários anos a conseguir.

Entre os diversos quadros do espectáculo nos quais participei, destaco "O Boudoir Feminino" que viria, anos mais tarde a servir de inspiração para o número final da rotina com a qual o grupo DESERTO & COMPANHIA viria a conquistar um 3º lugar no ESTORILMÁGICO CASCAIS 97. É precisamente desse quadro a fotografia seguinte.



Também um outro quadro ("Histórias por Frankenstein") me merece destaque pois serviu de base para o desenvolvimento da rotina "A Decapitação" do grupo SKORPIUS.

Além do tempo de ensaios e actuações no espectáculo MAGICARAMA, passei muitas horas em conversas com CALVERT no seu iate (atracado na Ribeira do Porto), nas quais tentei absorver o maior número possível de ensinamentos do showman americano. Dele guardo carinhosamente uma gigantesca brochura de promoção artística (com dedicatória) e a fotografia (também com dedicatória) que, seguidamente, reproduzo.



Uma gravação do espectáculo MAGICARAMA efectuada 10 anos mais tarde (quando Calvert já tinha 84 anos de idade) pode ser vista aqui:


E, porque o ano de 1975 é fértil em recordações, tal como prometido, haverá um terceiro post. Será publicado amanhã.


sábado, 5 de fevereiro de 2022

1975 - ANO TRÊS (Parte 1)

 


3º FESTIVAL MÁGICO DA FIGUEIRA DA FOZ... E NÃO SÓ

Depois do intervalo de 7 anos que existiu entre os dois primeiros festivais da Figueira da Foz, era consensual que, em Portugal, a Magia necessitava do contributo de um festival que se realizasse com uma certa periodicidade, sendo, na altura, considerado que o intervalo de dois anos era o tempo adequado para permitir, aos ilusionistas que pretendessem concorrer, fazer a alteração e o melhoramento das respectivas rotinas ou mesmo criar novas rotinas de raíz.

Por isso, em 1975, surgiu a 3ª edição do Festival Mágico da Figueira, com uma Comissão Organizadora encabeçada por Fausto Caniceiro da Costa e integrada por SAIUR (Delegado do Sul) e JOFERK (Delegado do Norte). Por ocasião deste festival, o Clube Ilusionista Fenianos do Porto decidiu publicar um número especial da revista MAGIA como saudação ao seu promotor (Fausto Caniceiro da Costa) e aos confrades presentes oriundos de outros locais de Portugal. Nessa revista colaborei com o meu primeiro texto original de ilusionismo (Um "gag" cartomágico) e uma tradução (Manifesto do "Comité da Defesa do Ilusionismo" que havia sido distribuído em 1973 na FISM de Paris).

Um dos convidados deste festival foi JUAN TAMARIZ e, novamente, me pude deliciar com tão criativo intérprete da nossa Arte. Uma iniciativa louvável da organização foi a publicação (com distribuição aos participantes) do livrinho "Os Ilusionistas e a sua Ética" da autoria de JÓNIO. E como seria importante que os jovens mágicos dos nossos dias lessem com atenção tal livrinho.

Nesta edição do festival apresentei-me a concurso nas disciplinas de Manipulação e Cartomagia. A minha prestação foi, naturalmente, bem diferente da que tivera dois anos antes, o que veio a reflectir-se nos dois prémios conquistados: 1º lugar em Manipulação e 2º lugar em Cartomagia. E quem venceu a categoria de Cartomagia foi precisamente o primeiro mágico a mostrar-me (em 1972) o que era BOA cartomagia: JOFERK. Por isso, para mim, o 2º lugar valeu como um primeiro.



Em virtude de ter vencido na categoria de Manipulação, integrei o espectáculo de gala do dia 9 de Junho.

E, pela mesma razão, viria a ser, mais tarde, contratado para actuar no Grande Casino Peninsular.


Entretanto, o Casino de Espinho decidiu, nos inícios do mês de Agosto, organizar um festival de ilusionismo. Foi o 1º FESTIVAL MÁGICO DA COSTA VERDE, o qual não teve continuidade em anos futuros como, inicialmente, tinha sido alvitrado. Neste festival todos os 18 concorrentes foram classificados no âmbito da modalidade Magia Geral e eu obtive o 3º lugar. Viria a ser contratado para integrar o show do Grande Casino de Espinho durante a primeira quinzena do mês de Dezembro.

O ano de 1975 é fértil em memórias. Por isso haverá mais dois posts sobre o mesmo. O próximo é já amanhã.