A MINHA PRIMEIRA FISM
O ano de 1973 ficou marcado na minha memória pela presença na FISM de Paris. Acho que muitos mágicos partilharão comigo o seguinte pensamento: a primeira FISM é inolvidável! Para mim ainda terá sido mais, pois nunca havia participado em nenhum congresso ou festival mágico.
A ida a tão importante congresso mágico foi rodeada de alguma peripécias que irei partilhar convosco. Em primeiro lugar convém notar que vivíamos num período político onde pontificava a ditadura do regime do Estado Novo. Embora Marcelo Caetano tivesse criado alguma abertura com a chamada "primavera marcelista" continuava a existir guerra colonial, para onde eram enviados os mancebos alistados no SMO (Serviço Militar Obrigatório).
Era um tempo em que muitos mancebos se escapavam ao cumprimento da prestação do SMO, emigrando "a salto" para países a Europa central, nomeadamente França. No entanto o governo permitia, a quem estivesse envolvido em estudos universitários, adiar a respectiva incorporação no SMO até concluir o respectivo curso superior, desde que tal conclusão acontecesse até o "adiado" completar uma determinada idade (creio que 25 ou 26 anos).
Nesse tempo ainda não havia UE (União Europeia), pelo que era necessário obter um passaporte para viajar. Naturalmente que era muito difícil ser atribuído um passaporte a um mancebo de 18 anos que queria viajar para França. Mas, com recurso a um compromisso pessoal do meu Pai, assegurando que eu regressaria após o Congresso FISM, lá consegui que me atribuíssem um passaporte de validade reduzida, quando o normal era uma validade de 5 anos.
Mas, mesmo após a resolução deste problema, outra situação poderia inviabilizar a minha viagem a Paris. As datas em que iria decorrer a FISM de Paris eram também datas em que decorreriam os exames universitários e uma das exigências de meu Pai relativamente às férias mágicas em Paris era a seguinte: eu não poderia prejudicar os meus estudos com tal viagem. Sendo assim aguardei a marcação de exames, sabendo que só poderia ir a Paris se o exame marcado para as datas da FISM fosse precisamente a disciplina a que havia dispensado de exame... E foi isso que aconteceu!... Claro que dei pulos de júbilo quando vi essa feliz coincidência.
A viagem para Paris foi feita de comboio e quem tratou de a organizar foi o Coimbra pois já tinha experiência de anteriores idas a Paris com grupos do Instituto Francês. Além dos quatro mágicos (DE ROCK, JOFERK, JOMAGUY e MACOS) o grupo integrou a Cristina (esposa e partenaire do JOFERK) e mais alguns amigos do Coimbra que iam passar uma semana de férias a Paris. Apesar de viajarmos nas carruagens ditas "couchettes" não deu para dormir o suficiente pois a expectativa de ir assistir a uma FISM a par do bom convívio entre todos não o permitiram. E também não deu sequer para abrir a "sebenta" para estudar para o exame que me esperava três dias após o regresso de Paris.
O programa da FISM 1973 (cuja capa está reproduzida acima) estava repleto de momentos que se revelariam inolvidáveis para um neófito em tais andanças, que nunca tinha sequer assistido a uma simples conferência mágica. E relativamente a conferências a FISM de Paris apresentou inúmeros "pesos pesados" da Arte Mágica, como por exemplo: FLIP, LIEBENOW, GEOFFREY BUCKINGHAM, NIC NIBERCO e DICK ZIMMERMANN. Em todas elas aprendi algo que me durou para a "vida mágica", mas destacaria como sendo as mais importantes para a minha aprendizagem mágica as conferências de Jean Merlin e Fred Kaps. Assistir à actuação de FRED KAPS numa das galas foi algo de muitíssimo especial e "beber" os seus ensinamentos transmitidos na conferência que proferiu foi mesmo a "cereja no topo do bolo". Ainda hoje constitui um dos meus "pequenos tesouros mágicos" as notas de conferência que adquiri e que ele, gentilmente, autografou,
A par das actuações primorosas de muitos convidados (SAMSON, SILVAN, TOPPER MARTYN, ALI BONGO, SHIMADA e OMAR PASHA foram alguns deles), tive a oportunidade de assistir às exibições de concorrentes (muitos deles de grande qualidade) com ideias e apresentações cénicas inovadoras e que rompiam com o modelo mais tradicional do estereótipo de um mágico. Direi que tais actuações como que ampliaram largamente a minha perspectiva da Arte Mágica.
Os Congressos FISM têm sempre uma componente social com um jantar de gala. Desta minha primeira FISM não esqueço a recepção que tivemos no Palácio de Versalhes com almoço na "Orangerie do Palácio", em que, ao entrar, tivemos direito a ser anunciados com o toque de trombetas à boa maneira das recepções da realeza. A comida (variadíssima) e bebida à discrição que nos esperavam constituíram um lauto banquete que proporcionou sadios momentos de descontracção e convívio.
Um dos focos de bastante interesse nos grandes Festivais e Congressos de Magia é a respectiva Feira Mágica. Naturalmente que a FISM não é excepção. Nesta minha primeira FISM, como estudante, as poupanças da minha mesada não deram para grandes flostrias. No entanto, uma das aquisições que fiz viria a ser fundamental na minha aprendizagem da manipulação de cigarros que, anos mais tarde, iria integrar uma das minhas rotinas mágicas. Refiro-me ao livro "Enciclopédie des Tours de Cigarettes" da autoria de Keith Clark.
Uma das memórias que tenho desse tempo é a da fraca participação dos associados do CIF nas respectivas reuniões semanais. Apenas os 4 elementos acima referidos que se deslocaram a Paris e o Sr. João Marques Pinto eram assíduos frequentadores das mesmas. No entanto nas primeiras reuniões agendadas pós-FISM o CIF registou uma afluência que eu, até aí, nunca tinha visto. Essa situação foi por mim caricaturada com o cartoon que seguidamente reproduzo.
NOTA FINAL: Amanhã publicarei um novo post em que partilharei outras memórias deste ano.
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